Abrapp - Um ano ainda mais desafiador

O ano de 2016 promete ser tão ou mais desafiador do que 2015 no que diz respeito aos investimentos dos fundos de pensão brasileiros e ao cumprimento de suas metas atuariais. Por conta do cenário econômico que ainda emite sinais preocupantes, tanto no ambiente doméstico quanto no internacional, as políticas de investimento passam a reforçar o seu lado conservador. A espiral inflacionária, cujo controle ainda provoca dúvidas, e a forte retração da atividade econômica, tornam difícil imaginar estratégias de alocação em setores produtivos da economia e projetar ganhos no mercado de renda variável  ou de produtos estruturados. Por outro lado, as estratégias de renda fixa baseadas quase que exclusivamente em títulos públicos – NTN-Bs-, que oferecem rentabilidades elevadas, não podem ser vistas como garantia absoluta contra o efeito da inflação sobre os ganhos reais. A volatilidade atinge praticamente todas as classes de ativos. As políticas de alocação, ainda que concentradas fortemente nesses papéis, demandam também um olho atento às possibilidades de diversificação e também muito cuidado no desenho das carteiras de títulos públicos, alertam os especialistas.
 
Na avaliação feita pela Willis Towers Watson, seu consultor sênior de Investimentos, Luiz Felipe Santos, lembra que as NTN-Bs passaram a ser um foco central dos fundos de pensão desde o agravamento dos problemas fiscais do País e a elevação significativa das taxas de juros, num movimento que foi acelerado ainda mais no final de 2015.  “Mas mesmo nessa classe de ativos é preciso ter estratégias que façam sentido porque o ano será muito volátil e as crises econômicas interna e externa parecem estar longe de seu fim, o que provocará ainda muito ruído nos mercados”, alerta o consultor. Uma aposta firme nas NTN-Bs marcadas na curva só faz sentido para os planos de Benefício Definido, analisa Santos, que podem comprar esses papéis e mantê-los em carteira. “Já  para os planos de Contribuição Definida (CD) e de Contribuição Variável (CV) não recomendamos a marcação na curva nem a concentração muito alta nas NTN-Bs porque o IMA-B pode trazer resultados perigosos dentro de algum tempo”.
 
O ideal, aponta o consultor, é sair desse indexador para aumentar a exposição ao CDI e reduzir a parcela atrelada à inflação migrando para o IMA-S, para reduzir o efeito do IMA geral na carteira. “Esse tipo de estratégia pode ajudar a reduzir um pouco a volatilidade nos portfolios que tem duration mais longa, porque a chance de as curvas abrirem é mais forte do que a de fecharem”. A opção tem sido recomendada pela consultoria aos seus clientes e os fundos de pensão têm adotado a estratégia em suas políticas, observa Santos. A tendência maior, portanto, aponta para uma renda fixa mais conservadora e defensiva, com uma parcela menor de ativos atrelados à inflação, mais CDI e um pouco de prefixados para desmontar o impacto do IMA geral.
 
 
 
Sem fechar portas - “O ano é de defender carteiras”, reforça o consultor Everaldo França, da PPS Portfolio, que não recomenda, contudo, o aumento da exposição ao CDI. “É difícil encontrar ativos que possam concorrer com a dupla CDI/NTN-B, principalmente com essas últimas já que é quase impossivel resistir à tentação de fazer hedge contra a inflação comprando NTN-B, mas é também uma opção complicada”, avalia França. Ele acredita que, se a gestão macroeconômica não encontrar uma fórmula para sair da atual crise, a relação dívida pública/PIB poderá criar uma situação delicada para esses títulos mais adiante. Sem contar com a perspectiva de que manter carteiras de NTN-B na curva pode ser um problema sério para os planos CD e CV, concorda França. “O momento exige posições defensivas, é difícil apostar na queda da inflação este ano, então não recomendo aumentar as carteiras de CDI”. Na avaliação de França, a melhor estratégia é não descuidar da diversificação, aproveitando tanto as boas oportunidades no mercado de private equity nacional como internacional e nos fundos de investimento no exterior. “Há uma parcela razoável de EFPC reduzindo sua alocação-alvo em ações mas o importante é que ninguém está dando passos atrás e fechando portas totalmente no que diz respeito à diversificação, estão deixando de usar seus limites definidos nas políticas de investimento para este ano mas mantêm a possibilidade em aberto”, pondera França.
 
 
 
Fundos não  referenciados - Largamente observada na prática das EFPCs desde o final do ano passado, a redução da exposição à bolsa deve continuar marcando as políticas este ano, concorda Luiz Felipe Santos. “Com as projeções do PIB brasileiro indicando quedas preocupantes e a China agregando maior turbulência aos mercados internacionais, é difícil imaginar resultados bons para as empresas”, afirma Santos. Mas é fundamental ir devagar nesse movimento para não ficar 100% fora da bolsa, até porque há posições difíceis de construir e de desconstruir nesse mercado e, quando houver um início de recuperação, como de hábito, ele será muito rápido penalizando quem estiver fora. A sugestão da Willis Towers Watson é de manter um portfolio de bolsa que represente de 10% a 20% dos ativos totais de cada plano, dependendo de seu perfil e dos estudos de ALM.  Na parcela de renda variável, a recomendação portanto é diversificar mantendo uma parte dos recursos aplicados em fundos não referenciados (cuja proposta não é a de seguir os índices de bolsa) e tem conseguido bons retornos até agora.  Ele sugere também, no segmento de estruturados, a alocação em fundos multimercados, que oferecem boas oportunidades e podem gerar rentabilidade interessante enquanto os FIPs e fundos imobiliários não estão em fase atrativa. “Os multimercados também têm um bom controle de volatilidade e a rentabilidade negativa nesses veículos é rara, o que pode transformá-los em uma alternativa relevante de diversificação”, analisa Santos.
 
A alocação no exterior é outro fator essencial para garantir bons ganhos e uma diversificação geográfica e setorial importante, assegurando a necessária descorrelação com os ativos domésticos. “A velocidade de lançamento de produtos nesse segmento tem sido acelerada e já há mais de 60 veículos de investimento disponíveis para as fundações brasileiras”, observa Santos.
 
Investir no exterior já se provou uma excelente opção e quem ainda não usou seu limite deve fazê-lo sem perda e tempo, reafirma Everaldo França, até porque os sinais não apontam recuperação da economia doméstica tão cedo. “Isso exige diversificação aproveitando para ganhar com ativos de países cujas economias estão indo melhor do que a nossa”. O ideal, acredita França, seria que houvesse uma elevação do limite para alocação no exterior, com uma revisão da Resolução CMN 3.792, elevando esse teto de 10% para 20% dos ativos. Embora a maioria dos planos ainda esteja longe de atingir o atual limite, uma elevação poderia ajudar a acelerar a oferta de produtos e incentivar alocações mais robustas.
 
 
 
Preservar o esforço construído - A diversificação é uma preocupação constante na política de investimentos da Fundação Real Grandeza, explica seu diretor de Investimentos, Eduardo Garcia. Ainda que a FRG, por conta das circunstâncias de mercado, tenha reduzido fortemente sua exposição em renda variável, FIPs e outros veículos, aumentando a concentração em títulos públicos, continua a ser valorizado o esforço de diversificação que vinha sendo feito pela fundação nos últimos seis anos e que havia levado a maior alocação em produtos estruturados e a estratégias diferenciadas em bolsa. “Caminhamos muito nesse sentido mas quando o juro atinge o atual patamar  - NTN-Bs com juro de quase 8% para uma meta atuarial de 5,7% por exemplo - ele freia todo o resto e desacelera naturalmente o processo de diversificação”, observa Garcia.
 
A carteira de renda fixa da FRG representa hoje 76% do total de seus ativos, sendo quase toda ela aplicada em títulos públicos para vencimento em 2050, casados com os vencimentos dos passivos. “Já na bolsa, nosso ALM sugeriu exposição zero mas entendemos que isso não seria adequado porque não queremos ficar completamente fora do mercado e, embora o portfolio de ações que hoje é de 15% do total deva ser reduzido para  dois terços disso, vamos insistir em ficar pelo menos com esses 10%”, diz Garcia. O objetivo é não jogar por terra toda a estratégia de diversificação, até porque a FRG fez um esforço importante do ponto de vista de governança interna para aperfeiçoar os processos de seleção de gestores e de alocação em empresas, seja por meio de ações, FIPs e outros. “Construímos um cenário de longo prazo para analisar empresas, incluindo aí critérios rigorosos de governança corporativa, responsabilidade social e ambiental, e seria ruim desmanchar totalmente essas posições, então a intenção é fixar um piso para preservar a diversificação por motivos estratégicos”, afirma o diretor da FRG. ( Martha Elizabeth Corazza )