O ambiente macroeconômico e o cenário político, que encerram 2016 trazendo uma reversão das expectativas otimistas do mercado financeiro, prometem seguir pouco amigáveis à diversificação de carteiras de investimentos dos fundos de pensão, ao menos no primeiro semestre de 2017. A tendência é de que seja mantida a concentração de alocações em renda fixa, apenas com algumas janelas de oportunidade em outras classes de ativos. Isso por conta dos obstáculos, já admitidos em consenso pelos especialistas, que devem travar a retomada da atividade econômica, com a manutenção de um juro real elevado no curto prazo e o risco de aprofundamento da recessão. Ao mesmo tempo, porém, a sinalização de queda futura nos juros pagos pelos títulos públicos em sua curva longa mostra que a diversificação é uma necessidade, ainda que precise ter sua dosagem e timing rigorosamente calculados.
Nessa conjuntura, uma das expectativas que marcam a agenda de debates da Comissão Técnica Nacional de Investimentos da Abrapp diz respeito à revisão da Resolução CMN nº 3.792, que trata dos investimentos das EFPCs. A medida era esperada durante todo o ano passado mas, com as mudanças no âmbito governamental, acabou sendo postergada. “Esse é um tema que continua sendo prioritário para a CTN, até porque o escopo das mudanças na legislação precisa ser novamente definido, não se sabe ainda qual será a abrangência da revisão”, explica o coordenador da Comissão, Maurício Wanderley. A reforma regulatória poderá contribuir para estimular a alocação em determinados segmentos a partir do momento em que o juro dos títulos públicos deixar de assegurar o cumprimento de metas.
Timing para o risco - Enquanto isso, nas políticas de investimento que acabam de ser definidas para 2017, pouca alteração é percebida em relação aos objetivos que haviam sido traçados no final de 2015, quando a economia dava claros sinais de aprofundamento da crise. Apesar de qualquer otimismo que tenha sido notado no mercado, os fundos de pensão seguiram e seguem cuidadosos no que diz respeito a assumir maior nível de risco, sublinha a consultora Francisca Brasileiro, responsável pela área de gestão estratégica de recursos de investidores institucionais na TAG Investimentos.
“Em dezembro de 2015 os fundos de pensão reduziram muito o risco, atingiram seu menor nível de alocação em renda variável e assim permaneceram ao longo de todo o ano de 2016, quando houve muito pouca alteração na alocação de risco”, diz Francisca. Em 2017, ela avalia que grande parte dos gestores das EFPCs já enxerga a necessidade de retomar uma trajetória neutra de risco, pensando no longo prazo, mas ainda estão inseguros quanto ao timing mais adequado para fazer isso.
Ajuste - A concentração das carteiras em títulos públicos federais poderá sofrer alguma alteração este ano, acredita o diretor da Itajubá Investimentos, Carlos Garcia, para quem o ano ainda pode trazer uma trajetória um pouco diversa para os fundos de pensão do que foi 2016. “De 2013 para cá vimos aumentar muito a concentração em títulos públicos, mas a inflação cedeu e a crise segue acentuada, o que deve abrir espaço para a queda das taxas de juros, com impacto nas políticas de investimento das EFPCs”, acredita Garcia. Ele lembra que o dinheiro já investido em papéis federais tende a continuar nessa posição até o vencimento, mas já começa a ser percebido um movimento maior em direção ao CDI. “Em lugar de realocar automaticamente em papéis públicos, os fundos de pensão começam a olhar mais para o CDI, então os novos recursos não voltarão com a mesma velocidade para esses títulos”.
Outro aspecto que influencia essa decisão é a regulação que mudou as normas de precificação de ativos e passivos das entidades. “A média de taxas de três anos ficará mais alta do que as taxas de juros e quando for feito o ajuste anual o resultado será negativo, ou seja, embora ainda haja ganho com o retorno dos títulos que já estão em carteira, os novos devem sofrer um ajuste negativo e isso tende a desestimular o reinvestimento automático”. A decisão de aumentar os investimentos em Bolsa, entretanto, só virá quando houver perspectiva de melhora para o País, admite Garcia.
Fatores internos e globais - Para o especialista da NetQuant, Marcelo Nazareth, a visão de investimentos dos fundos de pensão voltou ao que era no final de 2015 e início de 2016: “todo o otimismo anterior com o governo Temer foi revertido, e a visão de investimentos dos fundos de pensão começa 2017 muito parecida ao que foi no ano passado”, diz Nazareth. Em termos de diversificação, ele vê apenas os investimentos no exterior como uma possibilidade atrativa nesse ambiente e lembra que o câmbio poderá estimular essa tendência, assegurando o efeito da diversificação internacional.
Os motivos para essa insegurança, que atingem todos os investidores, estão ligados não apenas aos fatores internos de instabilidade mas também ao cenário internacional, reforça o diretor de Investimentos da Funcesp, Jorge Simino. A posse do novo presidente dos EUA, Donald Trump, adiciona um grau elevado de dúvidas sobre o comportamento de indicadores financeiros globais e seu efeito sobre a economia brasileira. “O ano de 2016 registrou uma oscilação muito forte de humor, foi um dos poucos anos em que os preços dos ativos financeiros foram tão afetados por motivos não financeiros aqui e lá fora”, observa Jorge Simino.
Ainda que no final das contas tenha sido um ano positivo para a rentabilidade dos fundos de pensão brasileiros, com um bom fechamento de taxas de juros na renda fixa e um rally forte na Bolsa, a elevada volatilidade foi a marca de 2016. E Simino destaca que “há muitas incógnitas para 2017, tanto nacional quanto internacionalmente já que os EUA de Trump prometem ser uma fonte importante de ruído nos mercados”.
Na avaliação de Nazareth, é nítida a deterioração do cenário doméstico, num quadro que é agravado pela insegurança em relação ao novo governo dos EUA. “Nao acho que haja espaço para uma alta dos juros americanos, é muito cedo para pensar na reversão da tendência de baixa dos juros globais porque não há inflação e a oferta de dinheiro continua elevada, mas de qualquer modo a eleição de Trump tem gerado nervosismo nos mercados por uma série de dúvidas sobre esse governo”.
No Brasil, o quarto trimestre de 2016 trouxe uma reversão das expectativas positivas, com o quadro político travando investimentos, analisa Nazareth. Se o início de 2017 será muito parecido com o de 2016, existe uma possibilidade de melhora mais tarde, dependendo do quadro político. “O ambiente político, porém, tende a melhorar de maneira mais consistente mesmo só a partir de 2018, com a nova eleição presidencial”, acredita o especialista. ( Martha E. Corazza )