Decisões do STJ sinalizam a forma de cálculo dos benefícios de previdência privada

Sob a ótica adotada pela jurisprudência, a previdência privada se caracteriza como matéria estritamente privada e contratual.
 

A jurisprudência do STJ vem sinalizando o entendimento de que o disposto no regulamento do plano de benefícios previdenciários deve determinar quais verbas devem ou não compor o cálculo do benefício previdenciário. Caso o regulamento não seja expresso o suficiente para definir o salário de contribuição, pode ser considerada alteração no regulamento para reduzir a margem de dúvidas, o que deve ser analisado caso a caso.

O parágrafo 2º do artigo 202 da Constituição Federal de 1988 e o artigo 68 da Lei Complementar n° 109/2001 estipulam que as “contribuições do empregador, os benefícios e as condições contratuais previstas nos estatutos, regulamentos e planos de benefícios das entidades de previdência privada não integram o contrato de trabalho dos participantes”.

A partir de uma interpretação dos dispositivos supracitados, a jurisprudência do STJ entende que a relação contratual mantida entre a entidade de previdência privada do plano de benefícios e o participante empregado não se confunde com a relação laboral mantida entre o participante empregado e a patrocinadora do plano de previdência. Partindo dessa premissa, consolidou-se o entendimento de que previdência complementar não integra o contrato de trabalho.

Apesar disso, em casos específicos, conceitos do direito do trabalho ou previdenciário podem influenciar na apuração de valores relativos à previdência complementar, mais especificamente na definição do que se entende por salário de participação.

De acordo inclusive com as normas da PREVIC (órgão regulador e fiscalizador das entidades de previdência fechada), o salário de participação de um plano previdenciário é a base para o cálculo da contribuição a ser vertida para o plano de benefícios, e as parcelas incluídas no salário de participação são definidas no respectivo regulamento do plano de benefícios. A partir das contribuições efetuadas sobre o salário de participação, calcula-se o benefício previdenciário.

Em razão disso, nas hipóteses em que o salário de participação não está claramente definido no regulamento do plano de benefícios, pode-se pretender incluir parcelas adicionais nesse conceito, com base no entendimento de que integrariam a remuneração do segurado na época em que efetuava contribuições ao plano.

Em razão da divergência de entendimentos sobre o tema, o Poder Judiciário vem sendo demandado a se manifestar sobre essa questão. O posicionamento do STJ com relação à natureza privada e contratual da previdência complementar pode ser visualizado em julgados recentes sobre o tema.

Recentemente, em 13.6.2018, foi proferido voto pelo Ministro Relator Antônio Carlos Ferreira, no Recurso Especial n° 1.312.736/RS, submetido à sistemática dos recursos repetitivos, no sentido de reconhecer o direito ao reflexo das horas extras habituais julgadas na esfera trabalhista com relação à revisão de benefício previdenciário, a depender do disposto no regulamento do plano de benefícios.

Atualmente, há um voto proferido. Em linhas gerais, foi reconhecido que, caso o regulamento do plano possua previsão expressa no sentido de não incluir as horas extras habituais na base de cálculo da complementação de aposentadoria, tal inclusão não seria possível.

De forma geral, esse parece ser o entendimento que prevalece no âmbito do STJ sobre o tema. Em outras oportunidades, o STJ se manifestou no sentido de que o conceito de salário-de-participação, para fins de cálculo do benefício previdenciário, deve seguir o disposto contratualmente no regulamento do plano de benefícios.

Em casos análogos, o STJ, firmou diversos entendimentos que corroboram com a ideia da prevalência da natureza contratual quando se está diante de uma relação de previdência privada e desvincula o regime de previdência complementar do contrato de trabalho do empregador.

Como exemplo, podemos verificar o julgamento do Recurso Especial n° 1207071/RJ, em sede de recurso repetitivo, no qual se pretendia definir se o auxílio cesta-alimentação deveria ser incorporado aos proventos de complementação de aposentadoria. Apesar de esse valor ser concedido mediante convenção coletiva de trabalho, em razão da sua natureza indenizatória, definiu-se que não se incorpora aos proventos da complementação de aposentadoria pagos por entidade fechada de previdência privada.

Esse tipo de entendimento demonstra, visivelmente, uma separação entre a relação contratual no âmbito da previdência complementar e a relação laboral entre participante/empregado e patrocinador/empregador.

Por tal razão, estas manifestações jurisprudências do STJ sinalizam uma tendência para a forma de se abordar a questão referente ao cálculo dos benefícios de previdência privada.

Sob a ótica adotada pela jurisprudência, a previdência privada se caracteriza como matéria estritamente privada e contratual, distinta da relação laboral, de modo que se deve privilegiar a manifestação de vontade das partes, disposta contratualmente, nos termos do Código Civil.(JOTA)